Nós que não somos naturais
Nós que não somos naturais, porque
somos quem nega a natureza, não
morreremos nunca de animais a morte.
Essa morte primeva, com que acabam
os que jamais souberam que viviam,
não nos pertence desde a hora em que
de humanidade nos fizemos homens
e ao sofrimento abrimos esta carne
embebendo-a do amor que não devera
ser mais que o cio do prazer sem nome
e sem memória alguma. Nunca mais
havemos de morrer em paz e espanto
de se acabar o mundo e não nós nele.
O que nos mata é a solidão povoada.
Jorge de Sena in Peregrinatio ad Loca Infecta (1969), em Poesia III, Lisboa, Edições 70, 1989
um blogue à deriva
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